UM CONTRIBUTO DO PRESIDENTE DA DIRECÇÃO PARA O DEBATE

O conhecimento é hoje um factor condutor do desenvolvimento sustentado em qualquer estrutura actual.

Mas para que o conhecimento seja, de facto, factor de desenvolvimento (isto é, para que a frase que acabamos de escrever não seja uma mera banalidade discursiva) é fundamental considerar que a) a produção do conhecimento, b) a sua disponibilização e difusão, c) a criação das condições para que este conhecimento possa ser utilizado de uma forma eficiente e objectiva através do domínio de metodologias e de um sentido crítico eficaz, d) a operacionalização da aplicação deste conhecimento pela produção de tecnologias apropriadas e das condições necessárias à sua rendibilização, e) a definição e o controlo dos processos empregues e das políticas e estratégias utilizadas, f) a estruturação dos mercados e do seu funcionamento se faz de uma forma ajustada e útil à distribuição dos produtos fabricados, e por aí adiante. Ficamo-nos, frequentemente, por concepções genéricas (conhecimento, ou mesmo I, D & T, etc.) que englobam realmente tudo o que queremos significar e visualizamos, mas esquecemos, de imediato, tudo o que têm de representar (o conteúdo das expressões, o seu “sumo”) para que o que dizemos tenha o significado concreto que de início lhe dávamos.

O “Ensino Superior” é mais uma destas expressões que utilizamos com frequência mas de que olvidamos o conteúdo complexo e intrincado, numa simplificação por vezes útil mas reiteradamente grave, pois esquecemos que “Ensino Superior” é ensino, mas é também, entre muitas outras coisas, educação, formação, investigação, produção (nomeadamente, de tecnologias, metodologias, estratégias, políticas, ideias, apreciações, análises e críticas), quadro de referência, etc.. E tudo isto, claro, com um sentido “superior” e não básico e elementar.

Se olharmos com alguma atenção verificamos que docentes e investigadores (e até alunos) deste Ensino Superior desempenham, individualmente, todas estas funções e são seus actores privilegiados. Constituem, assim, um centro nevrálgico do país, apesar de faltarem, quase sempre, as estratégias coordenadoras das potencialidades existentes que sejam capazes de optimizar o trabalho realizado e as capacidades presentes, por lhes dar um suporte, institucional e organizativo, gerador de sinergias úteis.

Tem sido preocupação do SNESup, apesar da falta de recursos e meios, não ficar pelo “simples” apagar de fogos do imediato, do dia-a-dia de um Ensino Superior complexo e difícil, por actuar no seio de uma estrutura por vezes demasiadamente superficial e pouco consistente. Ver mais longe por vezes não atrai quem está preocupado com problemas que em termos organizacionais poderíamos chamar de “de subsistência”.

No entanto, é preciso resolver problemas de fundo para que o imediato não seja tão premente e para que as soluções tenham um efeito duradouro e sejam eficazes.

É nesta articulação entre o urgente e a continuidade dos processos que permite rendibilizar actuações, procurando ter coerência nas acções e obter economias de escala até a nível estrutural, que vamos fazer uma apreciação do momento que atravessamos onde, de uma forma algo apressada, se estão a definir caminhos para o futuro que têm de responder, em simultâneo, ao triplo desafio de a) encerrar um passado sem desperdiçar o que tem de bom e tendo em atenção a riqueza da herança que nos lega, b) definir um caminho para o futuro que responda à instabilidade e ao desconhecido, do processo e do contexto, de uma forma eficiente e equilibrada, c) realizar a transformação necessária de uma forma corajosa e sem tibiezas, mas ponderada e criteriosa.

São desafios que terão consequências a médio e longo prazo e que exigem no imediato um cuidado muito especial, pois as decisões tomadas nesta encruzilhada em que nos encontramos e a forma de as implementar serão determinantes não só para a evolução do Ensino Superior mas também para a sociedade em que nos integramos.

 

O PAPEL DO SNESup NO ENSINO SUPERIOR

O papel de um Sindicato neste início do século XXI é bem diferente daquele que era assumido num contexto do século XIX ou até mais perto no século XX.

Sem entrarmos em análises do passado, mas alertando para a necessidade de fazer esta rotura com a noção de Sindicato que respondia a problemáticas e a contextos bem diferentes dos que hoje enfrentamos, de uma forma breve, diremos que um Sindicato hoje representa (e defende) os seus associados dando-lhes um espaço de debate e de apresentação de propostas com a força de um grupo, pois oferece uma infra-estrutura que dá solidez ao desempenho das suas funções de parceiros sociais, que amplifica “vozes” que individualmente mais dificuldades teriam em se fazer ouvir, logicamente com uma contrapartida de ter de existir um entendimento que consolide o grupo e lhe dê uma coerência agregadora das vontades individuais.

No caso específico do SNESup, dado o âmbito da sua actuação, o objectivo global é o de intervir como parceiro social na construção, regularização e controlo de qualidade de uma área que tem como função lidar com o conhecimento, a sua produção, a sua distribuição, a sua aplicação, a sua optimização. Lidamos, portanto, com um produto que está em plena expansão, que todos os dias ganha novas formas e outras dimensões, que se divulga com custos cada vez mais reduzidos e em espaços cada vez mais globais, que a breve trecho irá mesmo ultrapassar as barreiras das línguas (com as traduções automáticas) e que goza de uma liberdade resultante do seu carácter imaterial.

A “nossa luta” passa pela capacidade de inovar e não por um qualquer “combate de retaguarda” que vise manter algumas das condições obtidas no passado.

A nossa responsabilidade é a de responder aos desafios do futuro, ajudando a construir novas e mais eficientes soluções, tal como se faz em todo (mesmo todo, incluindo os países que usualmente se chamam de anglo-saxónicos, mas que extravasam os limites da desta língua) o mundo. Impõe-se ultrapassar (vencer) a tendência para um certo enquistamento que existe quer a nível conceptual, quer a nível institucional, que limita desde as condições de trabalho às avaliações que se pretende fazer, das noções de produtividade até às de utilidade que devemos empregar, dos custos de produção aos custos de utilização que pode ter, dos direitos de autor aos condicionamentos na distribuição que devemos considerar, etc.

O conhecimento é um produto muito especial que não se pode armazenar pois, no mundo de hoje, perde rapidamente o seu “prazo de validade” e é nas utilizações, que tem e que dá, que mostra a sua validade, pois não se consome e pelo contrário ganha força quando é usado, sendo uma espécie de catalisador que facilita as reacções mesmo quando nelas não intervém directamente.

Procurámos contextualizar um processo, avançando posições e defendendo ideias que poderão, evidentemente, não ser aceites pela maioria dos membros deste Sindicato.

Considerámos, no entanto, que era necessário abrir o debate e iniciar a discussão, marcando posições e, em função da responsabilidade que temos, “dando a cara” para facilitar um diálogo no III Congresso do SNESup.

Para concluir diremos ainda que julgamos que faltam políticas (a todos os níveis) que possibilitem uma orientação clara dos caminhos a seguir, possibilitando os consensos essenciais a uma boa prestação de todos os participantes e a um ambiente que permita um trabalho produtivo e objectivo.

É fundamental uma visão do mundo que não seja mero seguidismo de soluções, pois no quadro da nossa intervenção, como acima defendemos, há que desbravar o caminho a seguir, tendo a capacidade de perspectivar e de prospectivar problemas, opções e consequências, numa estratégia que tenha objectivos claros, caminhos bem definidos e direccionados e um ponto de partida que tenha uma correcta percepção da realidade e das condições em que nos encontramos.

António Vicente, Presidente da Direcção

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