Colega,
terminou na passada semana o período para apresentação de pronúncia em sede de audiência prévia do Concurso de Estímulo ao Emprego Científico Individual 2018.
Primeiro, importa referir que, caso a resposta à audiência mantenha erros de apreciação das candidaturas (como vários que nos foram comunicados por diversos investigadores), é possível interpor recurso hierárquico.
Esta mesma possibilidade existe em relação ao concurso de 2017, do qual não se conhece ainda a resposta à audiência prévia (uma violação de um princípio de equilíbrio, dado que os prazos curtos para a entrega da pronúncia, não parecem aplicar-se na resposta).
O tipo de erros cometidos pelos painéis de avaliação é uma das questões que importa corrigir, sendo importante relembrar que a infalibilidade papal não é um dom divino consagrado aos membros dos júris. Logo, pede-se a humildade de mais eficiência a seguir o Guião de Avaliação e na demonstração de que se leu efetivamente o que consta na candidatura, na sua versão completa.
A possibilidade de impugnação do processo de avaliação é real e isso confere uma maior responsabilidade à coordenação dos painéis. A figura do coordenador do processo de avaliação está aqui em causa.
Os serviços de Apoio Jurídico do SNESup estão atentos e daremos apoio a todos os nossos associados.
Por tudo o que se tem passado, existem algumas questões que merecem especial reflexão.
Recordamos que foi pelas dificuldades dos concursos Ciência e Investigador FCT que o SNESup defendeu ser necessária uma outra abordagem para o emprego científico.
Em bom rigor, é importante relembrar que no período de 4 anos, aqueles programas contrataram apenas uma média de 250 investigadores por ano. Aliás, como balanço dessa política importa consultar o documento que a FCT elaborou sobre o emprego científico.
É também importante referir que o SNESup sempre defendeu que deve existir uma política cientifica assente numa evolução dos percursos. Razão pela qual nos batemos sempre pela inclusão dos investigadores com percursos com maior maturidade na norma transitória do DL 57/2016 e no PREVPAP (o que não foi respeitado e tem graves consequências).
Os erros do passado passam pela objetificação dos investigadores, vistos como elementos para usar e descartar.
O caminho é integrar investigadores em carreiras e em instituições, fomentando equipas (e não clientelas). Por isso denunciámos a criação de uma carreira informal paralela, feita de contratos precários, que esvaziou a carreira de investigação, em prol do paradigma da “flexibilização”.
É assim, numa lógica de política científica, que devemos também salientar a forma como as candidaturas recomendadas para contratação foram orientadas para a categoria de Investigador Júnior (representando 52,7% das candidaturas aprovadas), em prejuízo da figura de Investigador Auxiliar (34,7% das candidaturas aprovadas), que deveria ser a categoria de entrada na carreira.
Mais prejuízo ainda para a fraca expressão das candidaturas aprovadas para a categoria de Investigador Principal (12,3%) e apenas uma aprovada para a categoria de Investigador Coordenador (0,3%).
Estes resultados sublinham, mais uma vez, que no centro da estratégia para a Ciência alicerçada pelo Governo e operacionalizada pela FCT, está a contratação de Investigadores Doutorados para uma pseudo-categoria, Investigador Júnior, a qual tem índice de remuneração inferior às categorias previstas no Estatuto da Carreira de Investigação Científica.
Mais uma vez, este concurso penalizou os investigadores com mais experiência, muitos dos quais foram os responsáveis pela formação de investigadores agora contemplados com os contratos de Investigador Júnior.
Considerando as regras do concurso e os dados públicos relativos aos indicadores científicos dos diversos candidatos é pouco compreensível como é que muitos dos investigadores que se candidataram à categoria Júnior obtiveram na componente Mérito Pessoal (Critério A, corresponde a 70% da classificação final) uma classificação superior à atribuída aos investigadores com mais experiência que se candidataram às categorias superiores.
Esta falta de estratégia origina confusão e falta de resposta, testemunhada pelo elevado número de Investigadores que se apresentaram ao concurso (3631 candidatos).
A estratégia em curso, que muitos associam a um esquema Ponzi, alicia jovens investigadores para o sistema científico, expulsando-os alguns anos depois ou condenando-os a uma situação de precariedade vitalícia, enquanto lhes nega o direito a uma carreira.
Assim, mais do que aumentar o número de vagas num qualquer concurso deste tipo, Portugal e os seus Investigadores necessitam de uma política coordenada para ciência.
Isso significa a definição de percursos e critérios, articulados com a inserção numa carreira de investigação, dentro de uma rede de instituições que garanta ao país a capacidade de produzir e usar conhecimento e inovação tecnológica.
Outra parte da questão passa pela forma como algumas instituições tratam estes investigadores, com regulamentos que parecem querer transformá-los em técnicos superiores, com uma “perninha” de Assistentes sem remuneração. Algo que oscila entre a prepotência descarada e a desqualificação da investigação avançada.
A chave é construir equipas (e não pirâmides ou clientelas).
Não é difícil corrigir os erros acumulados, mas tal exige um Governo para o qual a política de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tenha um programa bem pensado e não apenas uma colagem de algumas ideias sobre digitalização e redistribuição de financiamento.
Quando sugerimos a criação de uma Comissão para acompanhamento do emprego científico, não foi para serem apenas coligidos dados desatualizados, ou para se nomear alguém simpático para se ganhar tempo.
O debate que temos vindo a promover passa pela implementação desta reforma. Há muito a melhorar e a corrigir.
#éparacumprir #éparavalorizar
Saudações Académicas e Sindicais
Direção do SNESup
17 de dezembro de 2019